domingo, 30 de dezembro de 2007

Menina,

o que acontece com você?!
Quando foi que, de repente, você se tornou tão pessimista e descrente de tudo? E seus sonhos, menina, o que aconteceram com eles? E sua confiança, menina, o que aconteceu com ela?
Está certo, está certo, não é de agora... Mas antes eu ainda via um resquício de vitalidade, de grandeza. Escondidinhos lá no fundo dos olhos, mas eu via! Onde foram parar?
Você tem que parar, menina. Parar de se enganar, de acreditar em qualquer um que venha com palavras de ânimo pro seu ego, parar de fugir. Cria coragem, menina. Você pode adiar quantos anos quiser, mas isso será algo que vai perseguir você até o fim da vida. Seja forte, pequena, enfrenta seus medos. Você consegue.
Eu sei, eu sei que é difícil. Eu sei que você ainda vai cambalear um pouco até conseguir ficar firme em pé. Eu sei que não tem ninguém pra te ouvir ou tentar te entender, mas continua, menina. Continua. Não pensa nas coisas ruins... Não, pensa que você logo vai ser grande e vai poder se livrar de tudo que quer se livrar. Confia nisso, tem certeza disso, em você e vai ver, vai chegar lá.
O quê? Cansou? E o que há pra se cansar?! Você nem começou a viver, criança! Você sente falta?! De si mesma! Mas que bobagem, que bobagem! Não, pequena, você não pode! Não, pequena, olha pra mim! Aonde você vai assim? Pára com isso, agora! Você está me magoando, não diga essas coisas. Não, menina, por favor... Menina, o que aconteceu com você?!

domingo, 23 de dezembro de 2007

sobre o agora

O pior em crescer não é a responsabilidade, que aumenta, ou a alegria, que diminui (de acordo com meus modelos). O pior é que quanto mais velho você fica, mais você se dá conta de si mesmo. Mais pesado fica, e mais pesa pros outros. E os outros pesam pra você.
O esclarecimento é a maldição. Pior é crescer e os outros ainda te terem como aquela criança, imutável. Mas você mudou, e tudo mudou com você. E tudo se resume a uma questão: como carregar o peso da vida que agora se esclarece?
Não ensinam isso na escola, a família nunca fala disso. Temos que descobrir sozinhos, como em algum ritual de passagem? E se for pesado demais?
Tem aquele exato momento. O exato momento é aonde tudo se define, como nos filmes. Já perto do final tem um momento em que o protagonista bola um plano, na hora certa, pra se salvar: o exato momento. Se ele não tivesse se resolvido naquele minuto, provavelmente teria morrido nas mãos do vilão.
Então é o exato momento que se esclarece agora. Algum grito da natureza que acelera o relógio biológico: não temos mais tempo. E o tempo passa, sem parar. Sem parar. É algo angustiante, de verdade. Até que chega um momento em que você para de lutar: a água é fria demais, seus braços estão cansados, o peso da roupa te puxa pra baixo... Por que não?

Acho que todos nós deveríamos ter cães-guia.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Do tremor só sabia que fazia bem. Em sua simplicidade, adorava os arrepios. Às vezes tomava banhos frios de madrugada só para sentir. Tremer.
Lembra-se constantemente da vez em que foi assaltada, da arma apontada em sua boca e, ah!, do tremor. Como um vício, como o frasco cheio de uísque debaixo do paletó: corria àquilo por não ter onde se agarrar; e se entorpecia.
Pois o tremor era o oposto daquilo que faltava e que a assombrava. Ou seria consequência?
Só sabia que era sobrenatural, lhe dava arrepios. No frio, no medo, na ânsia, de dor: tremia.
O tremor afastava o espião. Afastava
a presença da mão do abraço em suas costas, abraço esse que já havia acabado, que nunca havia recebido. Mas, ah, a vida girava em torno daquilo. Daquelas mãos fantasmas, do peso, da garganta cortada.
Tremer era sua salvação. Era sua única chance de sentir seu sangue, seu pulmão. Única chance de ser toda vísceras. De se lembrar como é sentir. De tentar se lembrar como é sentir. De esquecer o que era o desejo
pulsante de continuamente desejar a vida.


quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Cada minuto que passa é outra facada no coração: é ela, ali, estirada no chão, sangrando, olhos vivos, pálida, gaguejando suas últimas palavras. Gaguejando por amor, gaguejando por um homem, pelo pai, pedindo perdão à mãe.
E se lembrou de quando era criança, se lembrou de quando a coisa mais fácil era sorrir. E sorriu.
Pensou na liberdade. Será que finalmente estaria livre?

Estava alucinando. Devia ser pelos remédios.
- Que remédios?
- Aqueles que esqueceram de dar a ela.

Com as últimas lágrimas, pegou o punhal já enterrado no peito, e afundou-o até corpo e punhal serem indistinguíveis. Estava, enfim, só. Não só com ela mesma, mas só com o vazio: era a dor pura, era tortura. Mas ela, sádica, sorria.






Magnus leu aquelas páginas em descrença. Sentindo-se completamente impotente: sabia que aquilo já estava fadado a acontecer. Ela, afinal, era a própria solidão.

domingo, 28 de outubro de 2007

De que cheiro é?

Era de um modo tão sua que lhe doía o peito e sentia a pata de elefante massacrando o coração. Sendo muitas e nenhuma ao mesmo tempo, parada, parada, parada. E queria lhe, lhe, lhe. E queria ir, ir, ir. E queria perder. Tudo a perder, perder tudo.
A criança calçando o sapato alto da mãe: era ridícula. Ridícula de. De quê? De não viver.
E ao acordar, queria recriar e criar e pintar e repintar.
Que cheiro teria a vida? Que gosto seria?

- Criança, tua mãe não te contou? O cheiro e o gosto são tu. Cala-te, apaga a pintura, some: tu te bastas; e só tu do mundo, e o mundo só teu.


Foi - e explodiu como supernova.

domingo, 21 de outubro de 2007

q

A primeira vez que a vi foi um tanto quanto extraordinária. Ela toda era um tanto quanto extraordinária. Não muito bonita, nem muito bem vestida, mas de uma coisa toda que calava qualquer um que a olhasse.
Foi na sala de aula (e em que outro lugar haveria de ser?). Lá estava ela, ignorando completamente o professor, que parecia também ignorá-la. Talvez fosse um consentimento calado entre os dois, mas eram invisíveis ao resto da turma. Pois sim: lá estava ela, me encarando. De costas pro professor, me encarando. Eu que, distraidamente, tentava desenhar algumas curvas sedutoras no papel, me enchi de medo ao ver que ela estava me encarando.
Com um sorriso debochado ela levantou o rosto, que antes estava apoiado sobre as mãos, no encosto da cadeira. Me encarando.
- Será que és tão interessante quanto eu penso que é?
(Minhas falas não são importantes aqui. Até porque tudo o que lembro ter dito, agora me parecem resmungos. Deixarei somente que haja a voz dela, pois ela precisa ser toda, absoluta.)
Nunca esquecerei o jeito que os olhos dela falaram. Brilhando, cheios de curiosidade. E não eram por mim, infelizmente, eram pelo mistério que até então havia entre nós: dela para comigo. Pelo projeto que havia de mim: pela esperança.
De repente, ela virou a cabeça em direção à janela, sentindo o sol forte. De olhos fechados se virou e veio caminhando até mim. E de novo me assustou: ela estava do meu lado, me encarando.
- Aquele garoto finge que não me conhece. - disse ela, agora de olhos abertos - Passei a aula toda olhando pra ele, e ele fingindo que não me conhece.
- Acho que ele não está fingindo que não me conhece, acho que só não acha possível que seja eu. Afinal, nós nunca nos vimos pessoalmente. De qualquer jeito - e calou.
Calou quando olhou para mim, estreitando a vista. O que ela queria dizer com aquela mudez?
- Aquele garoto, olha.
Não entendi. Ela me olhou com uma cara mortificada. Um triste horror. Como se o fato de eu conhecer o garoto fosse a causa de milhões de mortes de criancinhas na África. Eu entrei em desespero, por dentro, é claro.
- Bem agora, bem aí!
- Te tornaste mundano.
- Conhecendo alguém que eu conheço: te tornaste mundano. Até alguns segundos atrás, pra mim tu eras Deus. E eu até relevei o fato de falares, o ideal seria que nos comunicássemos por telepatia.
- Pois sim! Deus, veja só! Morra com essa satisfação agora!
- Eu devia ter ficado calada. Me arrependo de tudo. Tudo, tudo, tudo, tudo.
E foi embora. Ah, mas se eu pudesse me encontrar naquele momento e silenciar a todos gritando: "Pois pra mim és tu, e o significado de ser tu é ser o universo! E tu, Universo, é tudo! Não te arrependas de ti!".
Não, foi melhor não ter dito. Eu acabaria me arrependendo de ser tão tolo, mesmo que por ela. Tolice é castigo.
Talvez tenha sido apenas um surto. Desses onde a alma fala mais alto. Mas ela nunca mais me disse coisas parecidas, e esse dia foi como inventado. Depois veio falar comigo: "Olha, é que me perco sempre. E me encontrei ali, te amei ali. Mas passou. Entende? Não sou assim, aquela não sou eu. Eu sou Laura. Só Laura."

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Que isso?

Se me abrissem, não encontrariam nada além da escuridão. E sangue.
Estou fadada a sangrar, e sabes, amor, nem quero mais.
E se sangrasse, seria pra longe.
Sangraria pra longe de mim, pra outra metade.

E alguém enxergaria aquilo como sangue?
Preto, preto, preto não é sangue.

Quero amputar essa minha parte deficiente.
Essa parte que me, me, me.

E nem a pata de elefante eu sinto mais...
Até parece que é vida-morte.
Só hoje morri quinze vezes, acreditas?
Ou pra mais disso, não contei.
Mas morri e morri de novo.
E nem dói, sabias?
Nem sentes.

Olhos, teus olhos, nem sentiriam.
Eu me evaporaria em frente a eles e nem notarias.
Nem lembrarias algum dia dos meus, os meus olhos.
A mais tênue lembrança seria tomada como sonho.

Pois agora quem não existe sou eu.
E nessa minha não-existência, vou não-sendo até a eternidade.

Como suportas ser tão?
E de tão, me fascinas.

sábado, 6 de outubro de 2007

De podridão e salvação.



Hoje vomitei dor. Me passei perfume para disfarçar e escovei os dentes para tirar o gosto.

Disfarçar o que? De quem? Pois já não sei que não sou minha? Que independo de mim mesma?
Não tenho mais nome, a partir dessa noite.

E meu maior medo é acordar (o) amanhã.

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Título >Aqui<

O que mais me irrita é a minha incapacidade de distinguir as coisas. Porque tudo se mistura, vira pura sinestesia. E me sinto a pessoa mais ingênua do mundo.

A imprevisibilidade é a coisa pela qual mais espero. Preciso constantemente me lembrar de esperá-la com um escudo, ou então com pés bem fincados, pra não cair. Se bobagens me arrebatam, que dirá coisas de certa importância? Ou talvez as bobagens me abalem mais que coisas de real substância. Me desconheço.

Porque precisa ser tudo meu e para mim. E da onde vem tudo isso? A psicologia explica? Ausência, vazio, um nome. Nenhuma dessas palavras classifica o que tem impregnado em mim, como breu em lençol branco. É minha prodridão e minha salvação. E adoro.

Mas se me desconheço, como posso ser vício de mim mesma? A verdade é que não me desconheço, apenas não me sei completamente. Pois uma alma é vasta, e nas portas mais longes dos quartos mais distantes se esconde a imprevisibilidade.

É quando vem a ânsia. A angústia. Me falta a respiração. Me falta a respiração pela vontade de não ser, de não saber. Deve ser pela insignificância da minha vida diante de tudo. Tudo tão grande, os outros tão maiores, tudo tão distante e irreal. Bem aí! Me misturando de novo. Sinto o coração pular, e nem sei bem porquê. Deve ser o preto escorrendo e corroendo.



segunda-feira, 10 de setembro de 2007

Mentira

O que é um nome senão uma jaula? Que é isto a que te restringes e é e pronto? E o que acontece com a vontade de experimentar outros nomes, outros corpos? Porque um nome, já não basta um rosto?
Pro rosto, a máscara; e ao nome? a borracha?
E à sua história, a matança?

Um nome é a jaula dos sãos. Estes loucos por águas calmas e constância e constância e constância. Impossível libertar-se; ao nascer, já nasces preso. E existe injustiça ou crueldade maior?

E se afogar,
afogar,
afogar;
e apagar, escrever,
apagar, escrever,
apagar, reescrever,

carne, coração,
nomes não sangram: choram.
e desaguam na boca, e riem mentiras;
não grudam, não ficam, não lembram.
nomes corroem e repintam,
tão iguais, tão iguais.

o nome é a máscara da alma.

a fraqueza pulsante em continuamente desejar a vida.




quarta-feira, 5 de setembro de 2007

7 anos

Às vezes, queria ser gente. Sentado na varanda da casa, olhava o gato no chão, gordo demais para andar, sentindo o calor do sol quente daquele mês. Fechou os olhos e levantou a cabeça em direção ao sol. Vermelho. Abriu os olhos e contemplou: o vazio o enchia de conforto.

domingo, 2 de setembro de 2007

Hoje senti falta da minha infância. E lá foi como outra vida que vivi. E quando visito os lugares que são próprios dela, é quase como uma intrusão. É quase como sujar o pano branco e esconder para ninguém ver. Na outra vida que vivi, fui uma. Agora sou outra? Mas os resquícios existem. E eles respiram comigo.

sábado, 25 de agosto de 2007

It sucks to be me.

Essa frase tava escrita no botton de uma garota (devia ter seus 20 e poucos anos) que servia no bar no intervalo d'O Fantasma da Ópera, na Broadway. Ela chamou minha atenção. Lembrei dessa frase hoje e, consequentemente, dela. Me senti impotente ao ler aquilo. O que ela queria que eu fizesse? Não consegui comprar nada e voltei pro meu lugar.

terça-feira, 21 de agosto de 2007

Palavra calada.

Ódio a todas as mães que não nasceram pra ser mães. Àquelas que no fundo, no fundo, queriam mais é que não tivessem parido seus filhos. Ódio aos pais ausentes, esses incompetentes que vagueiam por terra como alma penada. Ódio aos avôs com suas onças e micos-leão-dourados. E às avós, mal-acostumando com amor. Ódio a tios e tias, tão frígidos, fingidos, loucos. Ódio a quem te enxergou crescer e esqueceu de te ver. Porque dói, e não queremos mais.

Solidão.

Nesses momentos, se movia lentamente e fazia tudo com cuidado. Enxugava o rosto com cuidado, para a pele não cair. Pisava com cuidado, para o chão não afundar. Tocava com cuidado, como se cada toque fosse o aviso iminente de que se quebraria. E falar era inimaginável. Se olhava profundamente ao espelho, sentindo o morno cair pelo rosto. Ah, mas se pelo menos alguém a visse... Ali, tão bonita, tão serena, tão ela. Laura chorava, sem saber o porquê. E chorava.

terça-feira, 7 de agosto de 2007

Uma e outra, as duas.

Laura era a mulher mais linda do mundo quando estava triste. Era a mais forte. A mais poética. E sabia. E sentia um fascínio por sua tristeza, porque a sua, diferente das outras, a trazia conforto. Laura se sentia cheia, completa, não sentia a falta. Se sentia irredutível, mulher, sábia, bonita. Sussurrava com sua alma e se sentia viva. Naquele momento, o mundo olhava pra ela, de um jeito completamente desconhecido. E se na presença de outros ela desejasse expressar seu carinho pela tristeza, tratava logo de se repudiar. A tristeza era dela e só ela. E só para ela e só com ela.

terça-feira, 29 de maio de 2007

E, às vezes, contra todas as chances, contra toda lógica, nos tocamos.

Dizem que ele já foi pai de família. Outros especulam que não passa de um vagabundo. Falam sobre ele o dia todo, sem cessar, fofocando e criando novas idéias. "Gente é um bicho doido", o papagaio da quitanda não cansa de repetir. O homem nenhum mal fazia, mas também nenhum bem manifestava. Sequer se pronunciava ou gemia. E o povo a falar e repetir e enumerar e aumentar e sugerir e concordar. Mas ninguém, nenhuma viv'alma se propôs a ir lá e sentar-se ao seu lado: "Me conte".
Mas havia uma garota de tranças no cabelo, calças jeans e um sapato velho. A ela sempre fascinara o mar. Nunca o vira, mas sabia que era de tamanha beleza que palavras não serviam para descrevê-lo. Sabia do gosto de sal e do grude que fazia nos cabelos. E do sol que, com a água, dourava as meninas na praia.
Um dia, enquanto observava sua mão, vermelha ao toque do sol, ouviu sobre o homem:
- Dizem que ele tem uns olho que nem que é a cor do mar! Eu duvido... ouvi dizer que mar nem tem cor.
Seu coração acelerou.
Encontrou-o no lugar de onde ele não saía, sentado, de olhos pro chão. Ajoelhou-se na frente dele e foi quando ele levantou a cabeça. Teresa pôde ver a si mesma naquelas ondas e enxergou cor onde a mulher havia dito que não havia. Perdeu-se; esqueceu-se da cidade, da mulher, do mar, do homem e dela mesma.
E até hoje as pessoas da cidade repetem e enumeram e aumentam e sugerem e concordam sobre como a menina afogou-se no azul.

sábado, 19 de maio de 2007

Fascinação

A que ponto começa a loucura? Quando as vozes aparecem e, com elas, os discos voadores?
Ninguém nunca realmente acredita nos loucos. Justamente o porquê de interná-los em lugares estranhos a eles, furá-los com agulhas e entupi-los com pílulas. Pois eu tenho uma pequena simpatia por loucos. Não sei explicar muito bem porque, mas tenho.
Deve ser por causa do escape. A loucura é um subterfúgio pra largar tudo o que há aqui neste mundo, na rotina de cada dia. É a culminância da solidão somada ao desespero. A agonia com o segredo, o nó na garganta, o grito cortado, a palavra apagada, o desejo se esvaindo. É a imaginação que não cessa de criar e figurar e pregar peças. É quando você acorda e não consegue distingüir o sonho da realidade, pois quem disse que a loucura dura pra sempre? Somos loucos por segundos e até minutos.
Você nunca parou pra pensar naquela teoria que diz que isto aqui que é o sonho e aquilo que supostamente sonhamos é a realidade? Nunca pensou que todo este Universo é uma brincadeira de qualquer criança mimada com muita tecnologia em suas mãos? Nunca mirou tanto numa idéia que, de repente, ela passou outro dia andando na rua? Ou vai dizer que nunca tornou uma fantasia tão real ao ponto de quase tocá-la?
Vivo momentos de ódio que são bem similares àqueles sublimes momentos de certeza. Minto: os de ódio são exatamente opostos aos de certeza. Na verdade, o ódio é causado pela incerteza. Isso tudo é real? O que realmente importa? Até quando vai ser assim? E os porquês que a criança de 4 anos não para de se perguntar.
Mas, pior do que os sublimes momentos de certeza, que duram minutos, os de ódio duram dias, semanas, às vezes nunca vão embora e se transformam em loucura. Diga-me, a loucura é algo ruim? Você acha? Talvez o que seja ruim pra você não seja pra mim. Como mentir. Estava pensando outro dia nisso. Morro de vontade de sair contando mentiras pra desconhecidos (ou até mesmo conhecidos), só pra me divertir um pouco comigo mesma. Mas me falta coragem.
Uma coisa que volta e meia me revolta são os valores morais da sociedade. É o famoso 'isso é certo', 'isso é errado'. São os limites, sim. É dizer o quão alto você pode voar, pra não cair. Mas e se quiséssemos cair? E aqueles que caem? Ah, esses são os renegados, os sujos, os imundos, a escória, a podridão da humanidade. Porque o ser humano que é ser humano não pode se dar ao luxo de cair...! Luxo, sim. Pois loucura é libertação.

quinta-feira, 17 de maio de 2007

, por favor.

Ela via nele algo que nunca vira antes em ninguém. Ela via nele a ânsia de procurá-la em todas as esquinas, em todas as lacunas, em todos os suspiros, em todos os risos, em todas as lágrimas, em todos os passos, em todo olhar, em toda frase, em toda gíria, em toda mania. Ela via o que queria, sem nem mesmo isso existir.
E ele se aproximou, sério. E ele a olhou, concentrado. Havia ali uma grande missão, uma música lenta e melancólica seria bem-vinda. Ela nem se via, não conseguia; era impossível. Ele, parado ali, era o mundo, o infinito, a vida, o passado. Ele ali, com aquele olhar instigador, era ela. Ele era seu reflexo. Ele era. Ele não existia.
E ele levantava suas (lindas) mãos, segurava seu rosto nelas. Com os polegares, alcançava os olhos. Sentia seu queixo, sua pele, sentia seus cílios trêmulos. E como um cego, ele a reconhecia: bela. E como aquele que encontra o que procurava, ele sorri. Mas ela nada vê. Ela está de olhos fechados, está nas mãos dele.
Ela abre os olhos. E vê o sorriso sincero, o olhar sincero, o toque sincero. Ele. Ah, ele. E comovida por tamanha sinceridade, ela chora. Chora. Reflexo do reflexo, a faz chorar. Ele a sorrir, ela a chorar. E na mistura do pranto-prazer, ela vê que finalmente chegou onde queria. A esperada sensação de que afinal é o fim a faz suspirar. Alívio.
E ele, gentilmente, diz:
- Agora vá.

Such Great Heights

I was thinking it's a sign that the freckles in our eyes are mirror images and when we kiss they're perfectly aligned. And I have to speculate that god himself did make us into corresponding shapes like puzzle pieces from the clay. And true, it may seem like a stretch, but its thoughts like this that catch my troubled head when you're away, when I am missing you to death. When you are out there on the road for several weeks of shows and when you scan the radio, I hope this song will guide you home.They will see us waving from such great heights; "Come down now," they'll say. But everything looks perfect from far away; "Come down now", but we'll stay... I tried my best to leave this all on your machine but the persistant beat it soundedthin upon listening and that frankly will not fly. You will hear the shrillest highs and lowest lows with the windows down when this is guiding you home.

Alma minha de todo o dia

Há aqueles momentos sublimes e intocáveis em que o ser humano sabe exatamente quem é e se sente confiante diante de si mesmo. Tem certeza de tudo e se sente forte; é jovem, mesmo velho. É aquele momento sublime em que a alma sobe do fundo de onde quer que ela esteja dentro de nós, e se gruda com a pele. E tudo o que você toca é a alma que sente. Tudo o que vê, é a alma que vê. Tudo o que ouve, é a alma que ouve. É ela ali no espelho, sorrindo pra você, quase como uma criança travessa. E a respiração se torna mais fraca e calma. E você consegue ouvir as batidas do seu coração. Você é grande! Gigante! Você está além! Além!!!
E então, lentamente, tua alma vai apagando o sorriso e, como que se despedindo para toda a eternidade, te olha com os olhos mais deseperadamente calmos; e num sussurro quase inaudível, ou talvez seja loucura, te anima e te beija.


Magnus se foi.

Carne de sangrar

Era hipnose. Seus olhos estavam vidrados na cena: o sol, iluminando o rosto dela, refletindo nos cabelos claros, e ela, serena, esperando. Divagou por várias horas sobre o que ela poderia estar esperando. Era encantador. Ela olhava para tudo, reparava em tudo. Olhos atentos. Esperando.
Logo quando chegou e se sentou, ela o olhou bem nos olhos. Ele ficou nu; ali, sem nenhum aviso, ela pôs-se a analisar sua alma. E ia fundo e voltava. Procurando. Esperando. Até que finalmente ela desviou o olhar. Mas ainda estava lá, o olhar grudado na alma dele. Bastaram segundos para ela colar-se à ele. Como podia? Aquele par de olhos não pertencia a ele!
Estava tomando coragem, aos poucos. Como sempre, pesando os prós e contras, os motivos e as desculpas. Odiava quebrar a rotina. Sempre que ia àquele lugar, sentava, tomava um café, lia e ficava observando as pessoas. Nunca imaginou que um dia ele seria o observado. Nunca imaginou.
Ele se levantou, com ela ainda lá, com seus olhos ainda lá, dentro dele.
- Acho que isto é seu. - E tentou arrancar o par de olhos. Imagine o susto dele ao ver que descolar aquele olhar sangrava! Apesar do esforço e de suportar a dor, não conseguiu se livrar da maldição.
- Não, isso é teu.
- Não quero.
- Não tens de querer. É teu, sempre foi.
- Nunca foi.
- Nunca parastes pra olhar.
- Olhar o quê?
E sem perceber, ele deixou ali nela seu olhar. E sangrava também.

Se levantaram em mundos opostos.

quarta-feira, 16 de maio de 2007

Da manchete:

Ai! Se sêsse!...
Zé da Luz

Se um dia nós se gostasse;
Se um dia nós se queresse;
Se nós dois se impariásse,
Se juntinho nós dois vivesse!
Se juntinho nós dois morasse
Se juntinho nós dois drumisse;
Se juntinho nós dois morresse!
Se pro céu nós assubisse?
Mas porém, se acontecesse
qui São Pêdo não abrisse
as portas do céu e fosse
te dizê quarqué toulíce?
E se eu me arriminasse
e tu cum eu insistisse
prá qui eu me arrezorvesse
e a minha faca puxasse
e o bucho do céu furasse?...
Tarvez qui nós dois ficasse
tarvez qui nós dois caísse
e o céu furado arriasse
e as virgi tôdas fugisse!!!